(qualquer verossimilhança é mera descoincidência)

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

À senhora secretária

Imagem do Google


Dona Eugênia foi, durante muitos anos, secretária da companhia Telefônica. Viúva de um casamento sem filhos, habita sozinha seu apartamento na Tijuca, patrimônio adquirido mediante financiamento de décadas. Durante os meses em que quitava as parcelas, compartilhava uma sociedade estável com seu Hermínio, militar de baixa patente. Quando ele faleceu, repentinamente, sentado sobre o vaso sanitário, o apartamento já estava quitado, mas a aposentadoria dela não seria suficiente para custear os gastos mensais com remédios para pressão. Foi então que Dona Eugênia se dispôs a retornar ao mercado de trabalho, como secretária no consultório da Médica Cardiologista, conhecida de anos do casal. Dona Eugênia hoje compõe a agenda de consultas com mesmo esmero da jovem iniciante da Companhia Telefônica, como se o ofício lhe fosse inato. Todos os dias, integra ônibus, metrô e curtas caminhadas, da rua onde mora, na Tijuca, até o consultório em Copacabana. Entre a jovem e a velha secretária, há um breve intervalo de alegrias e tristezas ordinárias. A velha, habitualmente, reconhece-se jovem, crendo na mesma metodologia de trabalho que aprendeu, nos valores que recebeu dos pais e na pouca importância do dígito "9", que deve anteceder os prefixos de celulares a partir desta semana. Dona Eugênia, em si, sempre foi a mesma, apesar da erosão do tempo e das chuvas.

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