(qualquer verossimilhança é mera descoincidência)

sábado, 27 de setembro de 2008

Sobre amor e aquela coisa toda



sobre o amor e aquela coisa toda
a gente s’embola
e chega a lugar nenhum.

melhor quando não pensa nisso
e, sem batismo nem lei,
se quer e se espera à toa
ausente qualquer fundo feliz de verdade.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Encaixe



Não nos amam pelos atributos,
Nem os perdemos se não somos amados
Tudo é normal nesse jogo de encaixe:
Uns não cabem nos outros

E quantas peças sobressalentes?
E quantas adaptações?
Quanto adjetivo substantivado!

A gente ama, porque não tem razão
E desama com razão:
às vezes, venta um esquecimento..

E seguem todos, em prova,
Na busca incessante do que não chega
Até que lhes venha a percepção e diga:
– Não há encaixe; só improviso!

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Manifesto ao punguista desgraçado

Passo ardendo pela orla
sob sol sincero de domingo 
esqueço o redor em volta 
todo dentro do meu som 

Passa-me um punguista-ciclista 
sem cuidado, com minha ambulante ausência 
e me bate no peito: 
foi-se todo ouro que me restava naquele cordão... 

Ah, se me levam também esses óculos escuros! 
perco ainda minha liberdade poética 
de chorar escondido pela multidão.

Paúra

Meu amor,
depois de grandes, temendo mergulho,
entregues ao raso
– Eu só avanço se for de boia!

Morremos de medo do durante
Morremos de medo das sobras
E viver com risco de síncope
é desconcertante.

Fico aqui, segurando os ponteiros
Dispersando a espera corrosiva
Raciocinando todo o sentido
Para que esse encanto seja praxe.

Mas é tão antinatural!
Almas rosetando, rosetando...
E a gente amarrando.
Que medo é esse que não é nosso?

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Pueril número dois

Meu amor,
Depois da vastidão, a gente se encontra
E se vê diferente daquela ternurinha:
Eta coisinha boba, tão pueril...
Fazer contigo aquela namoradinha de recreio que não tive.

Mas passa tudo o que é vago
E fica lá aquela florzinha de calçada, impassível:
parece mais rija que todas incertezas do mundo!

É nossa ternurinha com a fragilidade que suporta o tempo!

Pueril número um

Arundina, Rodolpho Saraiva

Sou tão criança pra essas desventuras amorosas
Amar não é mais só chegar, encostar
É contrato: há ônus, direitos, rituais, contas a pagar
Não há mais acordo silencioso
A vontade há de ser berrada: “Eu te amo!”

Cansam-me tantas intenções, sentimentos adjacentes
Tudo que não é puramente gostar
torna árduo o prazer de se achegar

E a dama é impávida
Cheia de olhos, bocas, mãos
E me vejo perdido: tenho tão pouca mão, tão pouca boca...
E morro de medo de olhares!

Poderia ser:
-chegar, encostar
-silencio repleto
-palavras guardadas na gaveta
-florzinhas (daquelas que brotam no meio-fio das ruas) no cabelo da amada
-e um beijo puro e primeiro...

Desfluente



A gente fica grande e desaprende a ser fluente
riso contido
choro escondido
só pra ser grande.

E amar fica assim sisudo
coisa de gente crescida:
-Amor, não te iludas!
Nosso amor não dura para sempre!

[Eis a ciência de ser maduro]

Tédio

Acompanho meus trânsitos
Astrais
E não encontro explicação para esse enfado mortal
Que quadratura explica esse tédio?

É feito uma morte lenta
Um sufocamento da vida
Um silêncio imperativo
Que nem se grita

Cala-te boca
Que boceja
Boca fechada
Não entra mosca

Quiçá esteja regido por astro
Cuja translação leva 360 anos
Em torno dum sol
Que um dia se apaga!

Não se vive:
espera-se
por aquele acalanto
que nos faz cerrar os olhos.

Transitório número três

Na volta pra casa,
do trabalho
tantos mudos,
pelo cansaço do dia.

Espiam-se, interrogativos:
“Que passou? Que será da noite? Da tua manhã?”

Transeuntes
tantos juntos
por instantes
nesse rumo.

-Ponto de parada!

Comunhão dissoluta.
Na hora chegada!
cruzam-se olhares
em partida.

Transitório número dois

Nas goteiras
dos ares-condicionados do centro da cidade
passo apertado
em meio a tantos passos
contidos, corridos, centrados
todas as gentes em guarda-chuvas
protegidas das incertezas do tempo.

-Esbarrão!

Dum lado seguem,
em fluxo.

Doutro, sigo eu:
conjugando o singular.

Transitório número um

Ando na rua sem tempo
Cruzo pessoas sem sentimento
Sigo, sigo, sigo.

Sopra o vento
Pinga a chuva
Desbota um pensamento

Sigo, sigo, sigo.

Uma espia, outra balbucia.
Uma se vira, outra se cala.
De que serve a fala?

Sigo, sigo, sigo.

Passa toda gente
Ínfimos traços diferentes
soam tão iguais.

[Sinal fechou:
Fazes cara de interrogação]

Mesmas caras
Inclusive as tuas
E não sei porquê te amo.

A cara-de-Clara

Os olhos odeiam equívoco! Acabam atrelando cara à pessoa. Vai haver tempo que não queira nada seu que não venha dessa loirinha aí. Com essa cara que não se define, mas é cara de Clara, pois se não for, você se zanga. Parece surgida de revista de consultório: empalidecida, depois de tantos folheios. Uma cara que desprende de alguém, e vira um efeite. Uma persona teatral. Ou esconderijo da nudez. Roupa que alguém tomou pruma festa, e não usou mais. Fica numa angústia estática: à espera de uso mais persuasivo. Com o encanto de ser cara-bonita, mas o desencanto de não ter vida. Despertando dúvida, descrença. Provável mentira, que não causa pavor... uma brincadeira. E segue lá, se afirmando sem expressão, prum olhar qualquer.

Pra começo de conversa

Faltou explicar o nome!

Por vício de comodidade, a primeira opção foi novasbossas.blogspot.com. Contudo, esse domínio está em uso (?), por alguma dita cuja que até hoje só fez um post: um recado tolo de amor. Ou seja, gastou o que seria nossa marca e espaço na preciosa rede pra mandar recado.

Mal que veio pro bem: inovamos. Haja bossa não perde nossa essência de bossa-novista. Além disso, o verbo exclamativo traz dois sentidos favoráveis: haja de necessidade, e haja de abundância.

Quanta bossa a gente tem pra falar disso?
Quanta bossa a gente usa pra falar de tão pouco?
Quanta bossa a gente precisa pra falar do que se quer?

Portanto, hajabossa é de uma só vez nome, desejo e caminho para nossa atividade bloggueira.

E dando pontapé inicial ao exercício literário, seguem além das novidades inevitáveis, uma seleta do acervo do novasbossas.blogger.com.br, que por razões técnicas, encontrava-se inacessível aos leitores.

Apresentação: experimentando o indizível

Cinco anos depois da primeira experiência bloggueira, no novasbossas.blogger.com.br, resolvemos mudar de casa para avivar os ânimos. Não se pode negar que os recursos do blogger.com foram mais atrativos, além da posssibilidade de maior interação com outros escritores e leitores. Sem mais delongas, desafiamos esse mar de idéias e expressões que é a internet. Vontade de ser percebidos não falta, mas sabemos da dificuldade. De fato, a satisfação não virá com reconhecimento de técnica, mas com a valia de atingir alguns corações. Reconhecimento há quando um leitor se reflete no texto, e vê nele algum sentido particular. Então o que se quer aqui é compartilhar. E para tanto, vamos louvar a liberdade, sem pudor de experimentar. Se há essa possibilidade, por que não desfrutá-la?