(qualquer verossimilhança é mera descoincidência)

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Réveiller

Copacabana está invadida por pessoas de todos os cantos. Autoridades estimam 2 milhões e 300 mil espectadores para a queima de fogos  (que durará quinze minutos). Nestes instantes que precedem um novo capítulo de nossas biografias, pensamos sobretudo no porvir: o ano velho merece ser descartado com urgência.

Eu, aqui, penso nos minutos que me restam de 2012 e na melhor maneira de escrever sua última estrofe.

Idiossincrasia pura esmerar-se nesse arremate, enquanto a massa pensa em sonhos e realizações vindouras.

O ano velho padece, satanizado, respirando por aparelhos. Talvez alguém, humildemente, reconheça que foi um bom ano, porque trocou de carro, encontrou um amor ou um novo emprego.

Mas a esmagadora maioria dos despachantes das areias de Copacabana ofertam cobranças ao mar. Querem mais, muito mais; numa sede insaciável de demandas.

Quiçá 2013, cuja numerologia já nos faz torcer o nariz (por conta de tantas maledicências ao número 13) não seja o ano dos sonhos de todos esses que esperam e pedem.

Contudo, a capacidade de desejar transcende à realização, portanto, a frustração é virtude inerente a qualquer sonhador que se preze.

Até que 2013 desperte, desejo a todos que cuidem de 2012: ainda há tempo para que esse capítulo receba um desfecho impecável!

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Fim-de-tarde

De um lado morre o sol,
em pleno verão.

Do outro, a lua cheia e pálida, aguarda sua hora de estrela.

No meio, o Cristo redimido;

e nas pedras, homens minúsculos aplaudem.

Mientras

Os casarões dos quadros,
da sala de espera do consultório médico,
não são de Ouro-Preto - já disse o Dr. -
mas de São Luis do Maranhão.

O Maranhão não está mais longe que meu pensamento:
O ano finda, a vida encurta
e os arrobos não celestam como outrora...

"Amo amar o amor"-
vaga idéia que me devora.

Sou mero espectador de mim:
desamando em lotes, à ação do tempo;
como os casarões maranhenses, ruindo na parede.

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Boas Festas!

Que o Natal esteja em todos os dias
com o abraço de quem veio
e a lembrança de quem já foi
(ou não quis ficar).

Que no Natal haja sempre:
-presentes,
-embrulhos debaixo da árvore,
-bicleta,
-espera do Papai-Noel.

Que haja Natal em nossos batimentos
ainda que o pisca-pisca apague,
e esteja a ceia deposta
e os entes distantes.

Que o Natal seja presente o ano inteiro:
reiventando crianças.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Sabiá_à_mente

Imagem do Google


ah, se eu pudesse resgatar minhas ignorâncias mais maduras...

e desfrutá-las de novo
como se não soubesse o gosto
como se nem houvesse o gozo

e escutasse o inaudível como a primeira audição do Sabiá

sabiamente, canto:
a ignorância é meu acalanto.

sábado, 15 de dezembro de 2012

Quando eu poemo

Imagem do Google

Quando eu poemo
eu, emo,
amo a ema que há em mim:

Vejo do alto os sentimentos do mundo!

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Estabilidade

"Tempos Modernos", imagem do Google.


O tempo estável: sol sem nuvens.

A vida segue estável: não troveja, paletó na cadeira, crédito consignado,
prestações em dez vezes sem juros...

Estável - quando nada acontece.

A estabilidade é um projeto de vida letárgico da geração que tem preguiça de sonhar.

Que tem medo de risco;
Que tem medo de chuva;
Que não suporta a própria dor.

Estável é quem respira por aparelhos!

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Sumidouro quatro

Paquequer, Rodolpho Junger

sumir
é melhor do que
ser esquecido

sábado, 1 de dezembro de 2012

Fígado

Minhas emoções corroem o fígado,
justamente órgão que não sente dor.

O hepatograma acusa filigranas
(do que ganhei e perdi)
circulam morbidamente por artérias e veias...

Sou herdeiro de mim, meeiro das comunhões que vivi.

No fígado residem meus ex-amores.

No regrets



I have no regrets:
My way is in front of my choices.

A Cura

A Cura não tem remédio.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

felicidade e seu tempo

Parque del Retiro, Madrid, por Rodolpho Saraiva


Minhas atenções atentas ao que está passando...

Meu átimo é trem; se pego o próximo, atraso.

Minha hora é a mais pura poesia: segundos são versos, minutos estrofes
(e as pausas são rimas)

Sou o que sou agora; dali a pouco, posso não restar.

A presença do presente me regala o instante que me bate o pulso:
Sou o que me deixo estar.

A felicidade não é do meu alcance:
se seguro pelo braço, ela vai simbora.

domingo, 25 de novembro de 2012

In my life

Saudade de algo que vem e passa;
Corre pelo sangue e o hemograma descompassa...

O que não me coube, deixei pela estrada:
Amigos de colégio, faculdade, velhas mudanças, sonhos, namorada...

Todos poemas que já vesti e não são da minha talha
os amores vãos
(e o que se já foi)
tudo se amealha!

A vida apelida de saudade
a despedida desacolhida pelo peito;
o que desamei e não tem jeito.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Casas-de-veraneio

Quando era criança convivia com muitas casas de veraneio.

Em Teresópolis, há várias propriedades que passam semanas ou meses sem receberem visitas de seus donos.

Essas casas preservam uma força única nas paredes, nos jardins, nos móveis. Tudo, salvo plantas e insetos, conserva-se no mesmo lugar: mesas de jantar, lareiras pouco utilizadas, poltronas, cadeiras de varanda, vasos e tapetes.

Os objetos, embora ressintam serventia, descobrem sentido que ultrapassa a decoração: tornam-se os próprios habitantes daquelas casas vazias, sonhando festas repletas de comidas, crianças, namoros pelos cantos, brincadeiras e música.

Tanto espaço em aberto: linhas em branco para a poesia.

Hoje volto a Teresópolis e revejo as velhas casas-de-veraneio resistindo à dilúvios e estações, hábeis na arte de autossuficiência.

Recanto do Golfe, Rodolpho Saraiva

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Telúrico

Revendo minhas nuvens douradas, Rodolpho Saraiva


Sou telúrico, sou mateiro...

Minhas nascentes vêm do alto das montanhas.

Lambo capim feito gado
Lambo o leito, como o rio

Como como o rio:
arrasto tudo que me assola e transbordo,
causando arrepio.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

O impressionismo e a modernidade

Impresion, Soleil Levant, Monet

o impressionismo me impressiona
minhas impressões se renovam

moderno é o que me trova

imagino o que sou diante da arte:
refém da luz que furta a cor ao cair da tarde

sem alarde, então me arde:
paisagem eterna, que eternece minha vontade
imagem quase imaginária...

- a impressão do sol que se levanta é o que me faz de pé

O Poeta e a Cidade


O poeta habita o concreto.

Só assim suas abstrações tornam-se tangíveis.

Entre tantos, em carros, ruas, pontes, viadutos
Pontos de ônibus, estações de metrô,
Bares, cafés, praias e praças... multidões.

Caminha o poeta solo, no seio disso tudo
no seio dissoluto, carrega campos verdes.

O poeta é raiz quadrada,
Transeunte na calçada;

-Uma equação verde!

Curto e compartilho



O poema é curto,
meu curto;
por isso curto

e compartilho.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Idiossincrático número cinco

Reclamo,
Pois o reclame é meu anúncio
E só por anúncio eu me vendo.

Sou, sim, uma catarse que vaga.

Desafirmei meus gostos
Desatei minhas certezas
Hoje só tenho um sabor:

Do vento.

Vento que me venta,
arrasta feito folha gasta pela rua.

Se um dia já fui de árvores
Hoje prefiro raízes...

Tubérculo, à beira de me enterrar em alguém.

-A melhor sepultura do mundo é a mulher amada!

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Auto-ajuda


Os livros de auto-ajuda empilham-se.

Serei feliz?
Que faço eu do mundo?
Como conquistar alguém?
Posso alcançar sucesso profissional?

Mil e uma maneiras de consertar-se ou aceitar-se errado.
Trezentas mil dicas para que você seja Você mesmo.

Nas estantes largas
aguardam afoitos
leitores desesperados.

Estes livros não se ajudam?

Afinal, de onde vem a Ajuda?
De si, de Deus, ou de alguma mão estendida?

Ajudar-se é a pretensão mais canalha dos nossos tempos!

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O Poeta e o detalhe

O poeta se interessa pelos detalhes que o detalhista não vê.

sábado, 13 de outubro de 2012

ágora

TUDO tem a sua hora;
eu não:
tenho tudo AGORA.
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quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Rua Boa Ventura Thomaz Fagundes



Minhas remotas aventuras de infância tinham endereço:

Rua Boa Ventura Thomaz Fagundes,
número 131.

Já fui homem-aranha, ninja, herói-japonês;
experimentei a vilania experimentalista de infante;
brinquei castelos, esconderijos, armadilhas.

Tudo que sou remonta o que poderia ser naqueles tempos
nos velhos tempos das Boas Venturas Thomaz Fagundes.


quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Sem-teto

Sou um causo sem casa.
E me causo um mal que me habita:
de não habitar casa alguma.

Ao revés: tenho hábito de habitar a luz da rua.

Meu pernoite me desacolhe, olhando postes e calçadas
que não me dão boas vindas...

Caso meus causos,
e não caso em casa alguma.

Tenho um sonho de morar num lugar
onde as histórias me cheguem pelo Correio.

domingo, 7 de outubro de 2012

Demo_cracia

O povo quer, o povo fala, o povo dita
E carrega bandeiras sem cores,
num causo sem causa.

A lei seca não vige;
então, o povão se inebria,
cheio de si...

A boca-de-urna não mente:
invente um candidato de última hora e confirme.

sábado, 29 de setembro de 2012

4 anos do HB!!!

Dia 24/09 o blog HB! completou 4 aninhos. Já sabe alguns passos, algumas palavras...

Em quatros anos, o blog não mudou tanto. Nem a poesia que sabemos fazer.

A poesia é uma certeza muda. É uma colheita que muitas vezes não rende frutos.

O poeta percebe, capta a realidade com senso-sensorial-além-do-trivial. Não vê mágica; simplesmente atenta às entrelinhas mais insignificantes, mais singelas.

Poesia é a valorização do simples, da florzinha de calçada, das cenas que a pressa das responsabilidades não nos permite ver.

Quanto mais responsável, menos poeta se é.

E a poesia teima, como uma leitura infantil do mundo de miudezas. É a franqueza de não saber tudo; melhor: é a sabedoria de desfazer explicações absolutas, encontrar o prisma mais particular dos objetos, sujeitos, casas, apartamentos, cidades, roças, mares e rios.

O HB! não busca crescimento ou maturidade; prefere ser verdejante, inacabado, projeto que se rabisca a cada dia.

Criança que completa quatros anos e confia na sua longeva infância!

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Criação

Imagem do Google


O criador cria a criatura criadora.

O homem não cria no que poderia ser:
Deus...

Deus em si:
o Homem que cria, crê.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O poema é...

O poema é...
Uma coisa curta
Curta o poema!

O curto que te corta o corte,
E explode!

Soletra,
Só letra, que dirá palavra inteira,
Sexteto e redondilha...

Curta o corte que te curta,
E transmuda.

domingo, 16 de setembro de 2012

Monoamor

Monoamor, mon amour
quero, para sempre
todos os dias
mesmíssima monotonia com você.

Meu contentamento é todo seu
a quem confluem meus rios
mesmo sem riso;
contigo hei de matar e morrer o tédio

Ouço, surdo,
teu coração dizer,
sem estéreo:

eu também, monoamor!

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Poliamor

(sala de espera do oftamologista)

Você já tem programa pra hoje à noite?
(afinal é sexta-feira)
Ainda que esteja desinteressada, sua vida pode ser mais interessante...
um namorado gordo te espera...
enfim, é fim-de-semana.

Não proponho tirá-la do tédio e rotina, pra sempre;
mas por alguns minutos seremos descobertos...
Talvez você tenha um paladar inédito
tato ou eletricidade que eu desconheça...

Talvez seja só cisco no meu olho,
polén, amor
polén-amor;
poliamorismo;
porém, amor.
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quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Foto de Colégio

Revendo fotos de colégio
(cuja existência desconhecia)
aponto:

o da direita, virou dentista, protético, mudou-se pro nordeste;
ali, o que gostava de física, pai solteiro, foi a Havard;
o de cima é engenheiro no interior de São Paulo;

a garota mais bonita, casou-se e embarangou.
(Ah, quanto já lhe ensaiei de poesia!)

De todos, a maioria perdi de vista;
meus amigos revejo às vezes.
Já não somos mesmos,
mas nos lembramos vivamente de quando ainda éramos.

A lembrança me é remota e presente,
uma alma estranha que invade a madrugada desse quarto.
Pergunto se sou o que pretendia, à época;
o quanto fui, deixei de ser, ainda hei...

Certo é o destino:
o que segue sem espera
esparramando o desencontro.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Astigmata

Sombra, por Rodolpho Saraiva


Eu quero um lugar:
à minha sombra.

Os raios luminosos não têm foco na minha retina,
mas além dela.

Então...

Vejo, à parte do que fui, poderia e penso ser:
uma sombra que me segue fidelíssima.

Somos cúmplices dos acontecimentos,
e tudo que assombra às claras,
acolhe no escuro.

Eu e minha sombra,
refratários ao sol
e a qualquer existência já pensada.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Encanto das pizzas


Hoje sou nobre.

Poderia estar numa creperia parisiense, mas não
na Independência do Brasil, comemorei a minha:
numa pizzaria sumidourense, uma taça de vinho da casa;

Suave, porque não consigo ser seco.

Estou longe de todas minhas bandeiras, assistindo os pavilhões da política interiorana tremularem.

Se hoje deu praia no Rio, não me importo.
Durmo tranquilo, sem o burburinho;
com a certeza de que amanhã chove, pois a seriema piou.
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Impulso.

De desespero,
o desejo
me engole
obeso de fome
e explode.

Sem pés,
pairo ao chão.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Emotions


Em clima de romance (ou não)
no final dos anos 70, início dos 80
um casal nos concebia ao som...

Emotions.

Imagine o que tocava à época na rádio;
Imagine o som que te perfaz.

As emoções transcedem o audio estereofônico de 78 rotações;
cortam tímpanos de quem foi projeto:

hoje pulso, sou vida.

(Aos sons que me concebem uma saudade infinita)

Que os recalques se explodam!

Antes do ato, já esperas o aplauso.

Tuas gargalhadas são gravadas, como em seriado americano.
Teu stand up comedy anda mal das pernas...

O recalcamento sustenta o teu seio.
Sem ele, teu decote é uma lona desarmada
e as setas de tuas tetas desapontadas...

Não faz sentido o escândalo
porque o público conhece cada marcação desse palco;
as cenas conduzem à não-surpresa.

Que se explodam os recalques que aprisionam:
atores em papéis,
à mercê de dramas desdenháveis.

sábado, 25 de agosto de 2012

Beira-Rio

Meu mundo é pequeno, senhor...
e me amanhece com um tapa
quando me há sumo (caju)
no café da manhã.

O rio corta o chão, às costas do meu quarto
suas águas turvas já não contam histórias
do que lhe possa ter, um dia, o corrido

As rãs e os sapos batem papos em retirada;
a vida cursa em completa banalidade
bananeira à margem
(a)lento ao re(lento)

Desinteresseiradamente no cá lendário
volta-e-meia a sós, só de ida
delongas e prosas ao estuário
a mera hora é de lida.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Panta Rei

O rio Nunca
o mesmo
à montante
se reinunda
já que a esmo
há funda
outra fonte

Às vezes, se me lembro ou Rio,
certo é que sempre passa.

A vida, à beira, espera.

Mas o curso muda,
a água enturva
margem encurta

Toda história furta quando encontra o mar.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Meditação


Meditar é não pensar.

Medito, sem querer, quando:
-carimbo, enumero e certifico;
-vejo o verde;
-sou semovente pelos campos;
-deito na areia escaldante.

Se penso, logo, não medito.
Existir é não meditar.
Abandono minha existência inquieta se deixo de me pensar.

Não sou fruto do que penso, nem meus pensamentos me frutificam.
Às vezes, somos meros correspondentes;
noutras, nem entendo a ideia que me entrou sem bater.

Quisera ser o dono do meu pensar!
Mas há a musa, o trabalho, o final de semana...

O pensamento é filho do vento e eu nem quero saber de tempestade.

A meditação pode nos arrebatar sem treino, ao acaso, por mero esquecimento.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Sumidouro três

Imagem do Google

-Onde o Sr. mora?
-Próximo ao Sítio Barro Preto.
-Onde fica isso? Tem alguma referência, escola, igreja, posto de saúde perto?
-Não, não tem nada perto. Só pasto, algumas árvores distantes.

Há lugares sumidos, tão distantes da lembrança...
Lá, ou se vive o desalento ou se morre de inquietude.
Não se pode portar nem resquício das farras urbanas...

Nessa lonjura, os extremos são linhas de trem que se cruzam,
os limites mais severos de incomunicabilidade
convivem com a absoluta ausência de limites:

se as línguas não encontram ouvidos,
os olhos não esbarram em muros.

Sumidouro é terra do esquecimento;
esquece a ti mesmo, abandona teus pensamentos
então,uma meditação forçosa te tomará conta
como das vaquinhas-sagradas que pascem na colina.

A sabedoria não advém da perspectiva,
mas da capacidade de abandoná-la.

domingo, 29 de julho de 2012

Casa-da-vó

Era o maior reduto de liberdade e imaginação:
na casa-da-vó minhas unhas cortadas, numa caixa-de-fósforo, tornavam-se grilos
(só assim cortava as unhas)

Onde o empirismo me arrebatava,
estudando o exército de formigas na roseira...

Lá sempre nos visitava a Muda, vizinha do lado
muito falante (gesticulante)
a quem não se podia falar perto os assuntos mais sérios de família, pois logo caiam em domínio público...

Na casa da avó o arroz-com-ovo-mexido era diferente
pois a galinha botadeira era caipira
com malemolências especiais de sabores
(só assim comia)

os quitutes, os mitos, a ternura.

Quando hoje a visito, vejo que a casa se preservou igual, sempre um bolo sobre à mesa
mas a praça ao lado, a rua
correm numa velocidade absurda, com carros, prédios, fachadas de comércio...

Na casa-da-avó os minutos cursam outro tempo.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

ego trip nº 2

Imagem do Google


Nem terminei a primeira
e fui contemplado com mais milhas de viagem interior...
meu destino é entrar.

Pra dentro, sem saída:
às águas turvas do que sou.
Já me aceito rio, não pretendo ser mar!

Aos que são lançados ao mundo, digo
que meu canto é mudo;
sou o restante
do que quis ficar.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Tempo Perdido


Naquele tempo perdido
eu me encontrava
diante dos prédios que já me fizeram pequeno...

A rua, a praça, a escola, a pizzaria, o ginásio:
o mundo que me cabia...
já nem me cabe mais.

Não me caibo:
Estou enorme!

O que me reduz é saudade:
uma vontade de sentir pequeno diante de tudo,
e crescer de novo...

Verdejante.

Os anos que perdi me reencontram
com a mesma gana
de rascunhar sem qualquer capricho.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Enjoy the Silence



Eu gosto da vida, sim, eu gosto.

E sei que é sucessão de movimentos;
o burburinho que passa debaixo da minha janela me atiça;
os eventos, bodas, festas, amores - tudo que pode estar acontecendo
em algum lugar onde não estou.

A vida segue plena e não me espera no ponto.

Por que, então, segui-la?

Hoje curto quando calo
sem televisão, sem conforto
ao pão-com-mortadela
vejo mais: eu, agora, por opção.

Antes era medo;
hoje escolho, mas não encolho.
Vivo assim, desejando a minha sombra
e quando aquieto e aceito...

o silêncio vem e me beija.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Automatizados



A revolução industrial não revolucionou;
Homens inventam máquinas para servi-las,
Automatizados:

acordamos, escovamos, penteamos, comemos, saímos.

(5 minutos antes ou depois, sempre na mesma hora)

Vivemos às rédeas da rotina,
sem coragem de pensar sem rédeas.

protocolamos, registramos, autuamos, numeramos, certificamos:

-Por quê?

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Lacônico


Amor, não ouso quebrar nosso silêncio com poucas palavras...
Quero você com outras línguas!

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Ansioso

Por suposto, ansioso!
minh´alma carregada de ânsias
(anseios transbordantes)
que corrompem a fraca intenção de fiar-me nos caprichos do tempo

Que tempo!

Não posso ficar à mercê de sol e nuvens
se minhas tempestades são outras:

-eu me chovo, eu me raio.

De soslaio, me mordo enquanto não consigo
viver a debatência dos sentidos,
o querer senti-los;

não estou acima de qualquer dor ou alegria.

Apelo

Eu apelo,
je m´apelle:

-Poeta.

Refém

Onde está o meu mundo?

Quero deitar à minha sombra,
voltar às minhas árvores e raízes.
Meu destino, que era fuga
hoje é reencontro.

O ritmo alucinante dos acontecimentos estampado nos jornais
a barra de rolagem não se cansa
as histórias não se acabam, mas...

nada importa, quando não me escrevo.

Adotei algumas certezas à sobrevida mas,
o campo das incertezas é muito mais
sou de reticências
não esgoto em ponto final...

Refém;
mas posso estar além:
estouro o cativeiro da rotina.

-Meu alcance é questão de retina.

sábado, 7 de julho de 2012

Ne me quitte pas


Esse é o tempo de estiagem
(dizem os meteorologistas)
Uma entressafra,
que há de ser passageira.

Sei que a poesia estará à espera,
depois que isso passar.

Mas ansioso, não sei esperar:
não posso suportar sem ELA.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Copacabana, 6 de julho de 2012.

Copa, Rodolpho Saraiva


Nascida em 6 de julho
à porta da minha casa
nessa ex-Rua do Matoso.

O túnel (que era rocha) abriu-se ao mar...
Copacabana, assim:
antes intangível, depois destino, hoje passagem.

Mas sempre:
porto seguro, de chegada ou partida
entre o mar e o Rio;
Onde todas as águas se misturam.

-Copa é oca bacana pra qualquer índio do mundo!

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Mixed emotions

O desespero é a distância em relação ao sonho;
quando grito, me ouço
sinto que se aproxima:
o horizonte que me cabe nos olhos.

Meu limite é além do mar
meu amor, ultramarino
amo nas profundezas do que sou
nado, até vencer a borda.

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quarta-feira, 20 de junho de 2012

9ème, 10ème: À Tout à l´heure!


Como diz a música do Chico, sobre o fim "depois de te perder te encontro com certeza, talvez no tempo da delicadeza, onde não diremos nada, nada aconteceu... apenas seguirem como encantado ao lado teu".

As melhores experiências são as que nos modificam; são legítimos "causos de amor".

Quando ainda adolescente, na época do colégio, fui às exposições do escultor Rodin (1995) e do pintor impressionista Monet (1997), no Museu Nacional de Belas Artes do Rio, não podia imaginar que aquela arte me acompanharia para sempre, com magnetismo fascinante.

Ontem no museu Rodin muito me veio à mente: o reencontro, o sentido e o poder da arte, que entranha na alma das pessoas a tal ponto que, Camille Claudel, aluna de atelier e amante do escultor, produziu esculturas tão parecidas em estilo e qualidade, que foi acusada de plágio. Camille padeceu numa paranóia sem fim, mas deixou obras valiosíssimas, como a Valsa, exposta no museu, que exprime magistralmente sua relação de amor/arte com seu professor.

Voltando a Rodin, O pensador, sua obra mais conhecida, aviva nossa responsabilidade pelo pensamento e sua libertação. No beijo, ignoramos a necessidade respiratória, pausamos o tempo, e perpetuamos o instante máximo dos amantes, que é cada vez mais passageiro na vida cotidiana.

Andei pelos belos jardins do museu e ali fiquei, deitado ao sol, numa espreguiçadeira.

Fechei a tarde tomando café no Les Deux Magots, esperando encontrar Sartre, Simone e Hemingway, como Gil, do filme "Meia-noite em Paris". Mas deparei-me apenas com alguns garçons cheios de impáfia,  que servem a um bando de estrangeiros, que lá estão para cumprir roteiro turístico.

A fama tem esse mal: desfocar a essência das coisas.

(...)

Agora, je m'en vais au vent mauvais qui m'emporte, segundo o verso de Verlaine que levo em uma Antologia. É hora de partir, ser levado pelo vento.

Estive em Paris pela arte que, nas palavras de Rodin, é "unicamente sentimento".

Assim volto, com mala (ou alma) repleta de matéria-prima: sentimento, Todo Sentimento (tal qual a música do Chico), mais feliz, mais repleto e, espero, mais poeta.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

8ème: Sous le ciel de Paris!



Sob o céu de Paris já houve muita coisa; capítulos aos quais o livro de História dão especial relevo.

Visitando o museu do exército e o túmulo de Napoleão, imaginei quantos tramas políticas, econômicas e bélicas foram dramatizadas nesse palco. Impressionantes as armaduras medievais, vestes da cavalaria Napoleônica e, até, fardas dos soldados da Primeira e Segunda Guerra.

A Segunda Guerra, por ser tão viva em registros fotográficos e vídeos, me desperta uma constante curiosidade. Especialmente com relação à França que, após sacramentar-se vitoriosa com o Tratado de Versalhes, viu brotar um violento revanchismo alemão. Para protegerem-se, os franceses adotaram a linha Maginot, um traçado de várias fortificações, ao longo dos limites territoriais com Bélgica e Alemanha.

Contudo, as tropas do Führer encontraram uma brecha nessa linha defensiva e, com apoio de tanques e aviões, avançaram até ocupar Paris em 1940, obrigando os franceses assinarem a rendição no mesmo vagão de trem usado para o armistício da Primeira Guerra.

É chocante ver a bandeira nazista tremulando na Torre Eiffel e Hitller desfilando pelas ruas.

Durante os 4 anos de ocupação, Charles de Gaulle, refugiado em Londres, comandou um movimento de libertação, "França Livre". A partir de propaganda de resistência e campanhas militares na África (especialmente Bir Hakeim), o sentimento patriótico se revitalizou, até que o exército aliado desembarcasse na Itália e, posteriormente na Normandia. Paris foi finalmente liberada em agosto de 1944.

Após essa viagem histórica, dei-me uma pausa para um chocolate quente (inenarrável) e um doce tipicamente francês, o mont blanc, na tradicional confeitaria Angelina.

De lá, circulei a praça do Vendome, o Café de la Paix e tomei o metrô de volta a Montparnasse. Aqui, me rendi a atração que sempre esteve tão próxima: subida ao topo da torre de Montparnasse, prédio mais alto da França e de onde se tem a melhor vista da cidade. Tudo bem registrado em filme e foto.

Saindo do prédio, fui abordado por um rapaz e uma moça, perguntando se eu era católico. Convenceram-me a acompanhá-los em uma reunião carismática numa capela próxima, e deram-me uma Bíblia em francês. Foram alguns minutos de cânticos muito bonitos e uma roda de orações, algo que me comoveu muito; não conhecia nada parecido na Igreja.

Ao final, trocamos contatos e saí satisfeito por travar alguns minutos de conversa com eles. 

O antepenúltimo dia se encerra visto de cima, com uma pequena pausa reflexiva, dos perigos das guerras à    essência do amor cristão.

domingo, 17 de junho de 2012

7ème: Chopin au jardin



Domingo no Parque, dia de sol. O sétimo dia foi, realmente de descanso.

Café-almoço no tradicionalíssimo Le Select, perto do hotel.

Andei as cercanias do Jardim de Luxemburgo: contemplação do quase-verão parisiense, deitado na grama. Gente por todo lado.

Em seguida, passei pelo Pantheon, onde estão restos mortais de grandes nomes da história, como Voltaire, Rousseau, Alexandre Dumas, Émile Zola, Descartes: Aux grands hommes, la patrie reconnaissant.

Meu celular toca e ofende aquele importante símbolo do patriotismo francês. Imediatamente fui repreendido por dois seguranças para que desligasse o aparelho.

De lá, fui ao museu de Cluny, dedicado à arte medieval, bastante interessante, sobretudo na seção de malhas de armaduras.

Ao final, retornei aos Jardins de Luxemburgo, onde havia um recital: Chopin au Jardin.

De volta ao hotel, quitutes por todo lado: sorbet de morango, muffin de chocolate, tartelete de nozes.

Sabores em todos os sentidos! A tarde de domingo não poderia ser outra!

sábado, 16 de junho de 2012

Tour Eiffel

Tour Effeil, por Rodolpho Saraiva


J´attend que le jour est fait
pour, au sommet de la Tour,
regarder Paris (h)ab(r)illé dans les étoiles.

6ème, Versailles: "Qu’ils mangent de la brioche!"




Sábado, acordei bem tarde. Saí do hotel quase meio dia, debaixo de chuva e sem rumo certo. Com fome, resolvi experimentar uma creperia tradicional, em Montparnasse mesmo. O legítimo crepe francês é bem diferente do nosso, mas nas devidas proporções, é delicioso.

Com o tempo um pouco melhor, e ao lado da Gare Montparnasse, decidi me aventurar à Versailles. A viagem levou 20 minutos de trem. Na chegada, encontrei dois brasileiros; seguimos conversando até a bilheteria.

O que mais me impressionou foi a grandeza do palácio, construído por gerações de monarcas para ser o mais opulento de toda Europa. Até que, com a Revolução Francesa, o povo invadisse seus portões para, sucessivamente, condenar à morte Luis XVI e Maria Antonieta.

Fiquei ali imaginando a rotina, a grandiosidade dos rituais da corte para que, de repente, a realidade ultrapasse aquelas grades douradas e ceifasse todo o luxo, inclusive leiloando-se a mobília real.

Não obstante o heroísmo daquela revolta popular, posteriormente erigiu-se Napoleão como imperador, e novos monarcas sucederam-se na utilização do palácio, alguns mais, outros menos.

Embora represente símbolo do absolutismo e de uma aristocracia alheada do sentimento popular, Versalhes encanta pela imensidão de riqueza, nas construções e nos jardins.

Depois de alguns dias de caminhadas exaustivas, meus pés calejados fizeram jus a um aluguel de bicicleta, e pedalei pelos jardins durante uma hora. Uma experiência fascinante.

De volta a Paris, curti mais o supermercado, onde comprar brie é tão trivial quanto comprar banana no Brasil.

Agora espero escurecer, para tentar subir a torre. O dia no quase-verão é longo: o céu está claro até às 22h.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

4ème, 5ème: Capital do Mundo!



Rumo certo no quarto dia: Giverny, casa de Monet. Finalmente conheci as ninpheas, os jardins, as paisagens tão vivas em seus quadros que, recentemente, foram cenário do filme de Woody Allen, Midnight in Paris.

Cheguei de trem, a partir de Saint Lazarre. Viagem tranquilíssima de 40 minutos a Vernon e, de lá, mais 20 minutos de ônibus a Giverny. 

Nos jardins de Monet, na ponte japonesa e diante das ninféias, não alcancei plenitude contemplativa duradoura, por conta da quantidade de turistas, crianças em excursão e, inclusive, vários brasileiros. É um cenário extremamente singelo, mas infelizmente não pude exigir alguns minutos de exclusividade ali. 

De volta, observei pela janela o bucolismo daquele pedaço da Normandia, com construções bem típicas. Imaginei quantas camadas de história existem sobre aquele lugar, uma malha entrelaçada de séculos de arte, amores e guerras. Refleti também sobre o isolamento do Pintor em Giverny, numa fase mais madura. Não vislumbrei quando estarei pronto para tal experiência - sou intensamente urbanóide. 

Talvez ousei minha "Giverny" precocemente para, ao final, concluir que a juventude demanda que estejamos no epicentro do movimento.

Já em Paris, passei pela Fnac. Impressionante a quantidade de livros, filmes, discos. Os franceses mantêm uma rotina cultural invejável. Embora aceitem tecnologia, não fazem fetiche a tablets, notebooks e celulares. Comprei duas antologias de poemas franceses e uma coleção de CD´s.

O quinto dia foi dedicado ao Louvre. O museu acolhe acervo de grandeza de valor e variedade histórica e nos dá a sensação de que durante muito tempo pensou-se seriamente em consagrar Paris como capital do mundo. Essa pretensão é atestada pela realidade: a cidade ostenta acervo histórico, intelectual, cultural, estilístico que desperta profundo interesse aos turistas do mundo inteiro.

Segui o dia na exposição de Henri Matisse, no Museu George Pompidou e, após, sentei nos arredores para observar transeuntes e artistas de rua.

Chego à metade de viagem, com algumas metas principais já preenchidas, mas descobrindo a cada dia novos pontos de interesse. E principalmente: o barato que é abandonar a aflição turística e respirar a rotina parisiense, como se fosse figurante, ermo num café ou praça.